quinta-feira, 13 de fevereiro de 2020

Nascido em meio ao café, José Fernandes se orgulha de preservar as tradições do campo


O maior orgulho de José Fernandes Rodrigues (68) é a naturalidade cambeense. Seus pais, descendentes de espanhóis, chegaram a Nova Dantzig em 1934 oriundos de Ribeirão Preto (SP), onde cultivavam café. Nascido em 19 de dezembro de 1946, na propriedade que vive até hoje, seu parto foi no cafezal, quando sua mãe em meio à lavoura sentiu uma grande dor.                                     
O sitio, localizado entre o Caramuru e a Bratislava é chamado de Água do Cafezal e para chegar a ele em 1934, os pioneiros fizeram uma picada na mata virgem. “Era o período da 2ª Guerra Mundial e passaram dificuldades como à fome. Meus pais, Santo Fernandes Rodrigues e Maria dos Anjos Fernandes, hoje com 93 anos e vivendo em Rolândia, se casaram na propriedade. Com cinco anos meu pai me levava para a “lida” por não ter alguém que cuidasse de mim e aos oito anos comecei a trabalhar, abrindo covas para plantar os caroços de café. Havia poucas variedades na época, como o Novo Mundo e Caturra, as quais produzo até hoje”, afirma.                         
Outra recordação é o plantio quatro por quatro, onde a cada quatro metros se fazia uma cova de trinta centímetros e jogava os caroços. Depois de germinadas tampava-se a cova com madeira. “As primeiras colheitas se faziam com cinco anos, hoje os primeiros frutos nascem com dois anos. Os agricultores dedicavam um mês no plantio de três mil covas. O primeiro plantio da família foi em 1936 e os primeiros frutos em 1942. Para sobreviver no ínterim eles comiam produtos da terra como arroz, feijão, abóbora, banha e carne de porco, farinha e verduras, além de criações. Não havia energia e iam à cidade adquirir sal, açúcar e querosene”, diz. Outra dificuldade, segundo o agricultor, foi comercializar a primeira colheita, além de haver períodos de grande quantidade de café no mercado e, por isto, foi necessário incinerar ou enterrar o produto.                                                                                                  
Mesmo com as dificuldades a rentabilidade nos anos 50, 60 e 70 era tamanha, que os produtores dobravam ano a ano a quantidade de terras adquiridas com o lucro. Isto acontecia em Londrina, Cambé e Rolândia e os grandes fazendeiros ostentavam carros, algo incomum na época por não existir financiamento. “Havia 16 bancos em Cambé devido o movimento financeiro. Pessoas do Estado de São Paulo admiravam a riqueza e adquiram terras aqui para cultivar café. São inúmeras as peculiaridade do período, como não haver asfalto e poucos carros. Por isto, aos sábados e domingos o centro era repleto de cavalos e carroças de agricultores que vinham fazer compras. Não existia os grandes mercados e se comprava nas vendas. A mais tradicional era a Cilião, que marcava o fiado na caderneta, o qual era pago anualmente na época da colheita. O Cilião abastecia a Bratislava e era num grande armazém próximo a atual Sadia. O comércio ainda existe e é administrado por Milton Cilião, filho dos pioneiros”, recorda.                                                                                          
Outra dificuldade eram as geadas, que em 17 de julho de 1975 decretou o fim do ciclo econômico. “O café estava decadente por conta de geadas, juros bancários e grande produção que fez cair preços. Ninguém esperava algo tão forte como a geada negra. Era comerciante no centro e vi algo inédito: às quatro da tarde caia neve. Há uma passagem folclórica sobre Mozart Moresch, o maior produtor do município na época, que possuía avião e 16 fazendas. Com a neve cobrindo as ruas ele foi de camiseta a Praça Getúlio Vargas. Ao ver o tempo instável disse que não ia gear. Com o fato acontecido pela madrugada, pela manhã era difícil chegar à minha propriedade devido à estrada ter um palmo de gelo. Quando cheguei vi que não sobrou um pé de café. Os cambeenses sofreram muito. 90% dos agricultores migraram para a soja e a população migrou para a cidade. No entanto minha família persistiu. Deixei os pés no toco e após dois anos colhi café novamente”, diz.                            
Mantendo a tradição familiar, na propriedade ainda existe a tulha de peroba de 1938. A produção tem o mesmo processo do século passado, onde após a colheita é levada ao terreirão e rastelada para secar. “Levantava às quatro horas da manhã e lavava o café numa caixa para separar as impurezas. Depois de ensacado vendíamos para 20 compradores das “máquinas de café”, que exportavam mundo afora”, declara.                                                                                
Hoje aposentado, José Fernandes exerceu outras atividades como vereador, diretor do CAC, secretário de esportes, presidente do Rotary, dos Escoteiros e comerciante, onde teve a loja de confecções Marisol por mais de trinta anos. Eram dez unidades espalhadas no Paraná, mas que em 1990 preferiu vender para se dedicar a outras coisas. Assim, de 1993 a 1996 foi vereador e posteriormente candidato a vice prefeito do Adelino Margonar. Mesmo com o currículo, ele se considera o homem do campo, o pé vermelho e caipira, que autenticamente representam a identidade cultural da região.           
Atualmente ele cultiva 28 mil pés de café, tem mudas para renovar a plantação e implantar o sistema mecanizado. “São doze alqueires, com a mecanização posso aumentar a produção usando cinco alqueires”, finaliza José Fernandes, que também cultiva soja, milho, frutas, mandioca e legumes. Todos os anos, em setembro e outubro, ele aprecia a florada e o perfume dos cafezais, que anunciam uma nova safra.

Nenhum comentário: