A
música popular brasileira, além dos seus méritos rítmicos, melódicos,
harmônicos e literários, também construiu ao longo dos últimos 100 anos o
acompanhamento e apoio às grandes transformações sociais e culturais pela qual
passou nossa sociedade. Samba, canção, xote, baião, rock e música de raiz
repercutiram fases importantes da história recente, como retratam sambas de
Noel Rosa e Wilson Batista, abordando morros e favelas, a crescente
industrialização e as leis municipais que taxavam de vagabundo quem não possuía
emprego fixo.
Nos
anos 40, Wilson Batista escreveu o bem humorado samba “O bonde São Januário”,
censurado pelo Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP), pois a letra dizia:
“O bonde São Januário leva mais um sócio otário, só eu não vou trabalhar” e
contrariava a proposta governamental de Getúlio Vargas. O DIP recomendou a
mudança na letra e o samba ficou assim: “O bonde São Januário leva mais um
operário, sou eu que vou trabalhar”. Além da questão social, do trabalho e da
exploração da mão de obra, o samba abordava os novos meios de transporte na
vida urbana.
Geraldo
Pereira aborda a novidade das loterias em “Acertei no milhar”, enquanto
Herivelto Martins evoca bairros cariocas e a vida noturna então crescente com
seus amores, boates a boemia.
Um
samba antológico de Jorge de Castro e Wilson Batista (Mãe solteira) fala do
preconceito social no contexto da moça abandonada e com o filho nos braços.
Maria da Penha é porta-bandeira de uma escola de samba e “ateou fogo às vestes
pela vergonha de ser mãe solteira”. Em 1954, a música foi gravada por Roberto
Silva. Os anos 50 também foram marcados pelo período de desenvolvimento da indústria
e da tecnologia nacional, bem como da arquitetura moderna de Oscar Niemeyer e
cuja atmosfera foi captada por João Gilberto, Vinicius de Moraes e Tom Jobim no
movimento Bossa Nova. As letras eram mais coloquiais e o gênero brasileiro
namorou com o jazz e a música erudita de Chopin, Debussy e Villa Lobos.
O
tropicalismo, a Jovem Guarda e a aparição de músicos como Chico Buarque, Jorge
Benjor, Elis Regina, Edu Lobo, Milton Nascimento e Paulinho da Viola se deram
num conturbado momento político e de grande abertura sexual e dos costumes com
os hippies e o amor livre. As canções, as entrevistas e as manifestações
públicas dos artistas percorriam os anseios do povo brasileiro na luta por
liberdade, justiça social e direitos civis. Pelo impacto de suas músicas,
muitos foram presos, torturados e grandes nomes da MPB tiveram que se exilar em
outros países. Essa pressão em torno dos compositores e cantores mostra a força
que a cultura tem para simbolizar e denunciar momentos difíceis em uma
sociedade. Mesmo com o uso de metáforas, a arte incomoda a tal ponto de seus autores
temerem pela vida.
A
abertura política veio com o reconhecimento dos direitos civis e individuais e
também as eleições livres, mas sempre marcados por certa frustração coletiva,
como foi o caso da censura ao filme francês “Je vou salue Marie” nos anos 80.
Por isso, o chamado rock nacional cantou e gritou os entraves de uma sociedade
ainda aprendendo a caminhar pela democracia. Atualmente, liberdade individual,
internet e o retorno ao essencial da vida fazem parte das canções de novas
gerações de compositores e cantores brasileiros.
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