Resenha do trabalho de conclusão de
curso apresentado no Departamento de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem na
Universidade Estadual de Londrina, como requisito parcial a obtenção do título
de Mestre. O trabalho é uma autoria de Vanessa Lini e teve na banca examinadora
as Doutoras Joyce Elaine Almeida, Vanderci de Andrade Aguilera e o Doutor Ataliba
de Castro, da Universidade Estadual de São Paulo. A dissertação de Mestrado
toma como ponto de partida a investigação da Língua Portuguesa no Século 19 e
se embasa nos registros escritos Paranaenses e Portugueses. O mesmo tem o
intuito de observar fenômenos relacionados com as características próprias do
português brasileiro, analisar e comparar a língua escrita do Século 19 em dois
contextos: Paranaense e Português, no intuito de observar semelhanças em
relação às características descritas nos aspectos fonéticos, sintáticos e
morfológicos presentes nos dois corpora que estabelecem relação com o português
praticado no Brasil, além de observar traços conservadores do português de
séculos passados.
O termo manuscrito significa escrito à
mão e constitui um tipo de registro escrito de textos com suma importância para
o resgate histórico no que diz respeito a escrita e a história da língua. Os documentos
revelam a escrita de uma época e trazem à tona argumentos propostos, léxico, dados
históricos, lingüísticos, sociais e culturais. O trabalho está inserido no
projeto “Para a História do Português Paranaense”, coordenado pela Professora
Doutora Fabiane Cristina Altino, que desenvolve pesquisas e estudos sobre temas
relacionados à gramática e tradições discursivas. È importante citar que o
trabalho usa como fonte de pesquisa documentos manuscritos e propõe investigar
a língua do século 19 a partir da análise de registros escritos paranaenses e
portugueses, além de observar fatos lingüísticos considerados peculiares ao
português do Brasil e fenômenos que aconteciam em séculos passados na escrita.
A língua na sua diversidade através da variação lingüística: A diversidade
cultural social e econômica da sociedade brasileira evidencia a heterogeneidade
da língua portuguesa no Brasil. A língua se modifica no tempo e no espaço
condicionada a diversos fatores internos e externos de ordem sociocultural, histórica,
regional, situacional e entre outras que contribuem para o surgimento da
variação lingüística. Segundo Labov (1982), a variação lingüística é natural e
essencial a linguagem humana. Assim, o que exigiria explicação seria a ausência
da variação na linguagem e não a sua presença. Logo, a diversidade de uma língua
marca também a heterogeneidade dos falantes que usam como instrumento de
interação na multiplicidade do contexto de papéis sociais e das próprias mudanças
históricas na sociedade. Camacho (1988) há quase um quarto de século propôs uma
classificação para as diferentes formas de variação da língua: histórica, geográfica,
social e estilística. O aspecto histórico resulta das alterações com a passagem
do tempo é possível ressaltar vários exemplos como o termo irmos ele diz que a
passagem do tempo. Isto se exemplifica em termos que caíram em desuso, mas que
ainda podem ser vistos em obras literárias do passado. A variação social se evidencia
nas diferenças falas dos indivíduos, condicionados por fatores como grau de
educação, idade, sexo, nível social ou idade. Nesta variação se nota o uso de
gírias na fala de pessoas mais jovens e inerentes ao fator de sexo e gênero.
Ainda no aspecto social observa-se as classes distintas, caracterizadas por
normas de conduta e padrões culturais que geram padrões lingüísticos distintos.
Castilho (2010) considera que o fator social engloba as diferenças linguagem
entre falantes escolarizados e não escolarizados. Ele usa a denominação
variação sociocultural para caracterizar algumas diferenças na linguagem.
Quanto à variação geográfica, nota-se as diferentes formas de pronúncia vocabular,
estrutura sintática e pronuncias. Um exemplo é a diferença na pronúncia da
região nordestina em contraposição a maneira de falar na região sul. Quanto à
estilística, ela depende da situação de comunicação e vai conforme o contexto
ou grupo onde o individuo se comunica.
Variação e mudança: Variação e mudança lingüística são processos
que configuram a heterogeneidade da língua. Sendo de natureza sincrônica e
diacrônica, estas mudanças se interelacionam. Embora não necessariamente toda a
variação implique mudanças nas línguas, elas se modificam continuamente no
tempo, alterando aspectos fonéticos, sintáticos, semânticos e morfológicos, configurando
o processo de mudança lingüística. Faraco (2005) ressalta que embora as
mudanças lingüísticas ocorram continuamente, elas se dão de forma lenta e
atinge sempre partes e não o todo de uma língua. Portanto as mudanças lingüísticas
no decorrer do tempo são inevitáveis, pois a língua se caracteriza por seu
caráter não estático além de se constituir social, cultural e historicamente no
seu contexto de uso. O fenômeno de mudança lingüística pode ser um fato
continuador do distanciamento entre o português do Brasil e o português europeu,
visto que mudanças desencadeadas na fala em território brasileiro pode não
atingir território português e vice-versa.
Língua, dialeto e falar: Conforme Boléo (1943, p 10), a língua
é um meio de comunicação, uma maneira organizada pela palavra viva a fim de expressar
pensamentos, sentimentos, preocupações e sentimentos. Benveniste (1963), afirma
que “é pelo exercício da linguagem que o homem constrói sua relação com a
natureza e com os outros homens. Nesta perspectiva a língua caracteriza-se como
fonte de comunicação e instrumento de relações sociais”. Meillet (1906)
concebia a língua como um fato social: “Por ser a língua um fato social, a lingüística
é uma ciência social e um único elemento variável que ocorre para dar conta da
variação lingüística é a mudança social”. Da mesma forma, Labov (1968) comenta
que as análises do contexto social em que a é língua utilizada vieram demonstrar
que muitos elementos da estrutura lingüística estão implicados na avaliação
sistemática. Isto ocorre tanto na mudança do tempo, quanto nos processos
sociais extralingüísticos. Ressalta-se que dialeto e falar são denominações
usadas para nomear fatos heterogêneas de uma língua. Porém é complexo estabelecer
distinção e delimitação entre uma língua, dialeto e falar. Em
relação a dialeto, verifica-se a complexidade que envolve o termo, a começar
pelas divergências. Em relação a seu conceito é possível encontrar definições
que caracterizam um dialeto como algo inferior, linguagem de menor prestígio, fala
dos incultos, como uma língua menor, incluída em outra maior, conceitos que
tratam o dialeto como qualquer variação da língua.
Embora dialeto, muitas vezes se
confunda com falar, vale distinguir os termos. O falar se caracteriza pelas
diferenças locais do indivíduo, ou seja, o indivíduo fala diferente da
linguagem de determinada comunidade. Mas isto não implica a falta de compreensão
e comunicação entre falantes. O falar é um conjunto de meios e expressões empregados
por um grupo no interior de um domínio lingüístico. O dialeto configura-se como
uma variante da língua em que a compreensão é limitada, enquanto o falar se
define por diferenças mais específicas que não prejudicam a comunicação.
O português no Brasil: No Brasil o português foi introduzido
após a colonização dos portugueses em 1500 e se desenvolveu, conquistando seu
espaço aos poucos ao lado de outras línguas como a tupi-guarani, idioma
predominante na época. Silva Neto (1973) divide o período da implantação do
português no Brasil em três fases: de 1532 a 1654, em que predominava a língua
geral, idioma que remete ao Tupinambá, Tupi Guarani ou Tupi Antigo; de 1654 e 1808
a língua geral perde espaço e o Português se dissemina por toda a costa, ficando
a língua geral limitada às povoações do interior e aldeamentos indígenas jesuítas.
A partir de 1808 a língua sofre intensa revitalização devido à chegada de cerca
de dezoito milhões de portugueses que difundem a língua com maior intensidade.
Isto marcou a cultura local ao trazer mudanças sociais no ainda Brasil Colônia.
Com o aumento da população Portuguesa no Rio de Janeiro, São Paulo e Minas
Gerais houve a migração das elites rurais e famílias do campo para as cidades, acarretando
uma divisão social entre Rural e Urbana. No meio rural concentrava-se
descendentes de índios, negros e mestiços. A dualidade interferiu na linguagem,
pois no ambiente rural ainda se propagava a língua geral.
As hipóteses sobre o português brasileiro: O fenômeno de
mudança lingüística das transformações que ocorreram com a língua é fato evidente.
Nesta perspectiva, estudiosos se dedicam a pesquisa que explique essas
alterações. Castilho (1992) elenca três pontos sobre a mudança no português
brasileiro: a evolucionista, crioula e internalista. A evolucionista defende a
idéia de uma língua brasileira oriunda da língua falada em Portugal. A
crioulista aponta a importância os contatos no Brasil Colônia e a influência
das línguas africanas e indígenas. Conforme o autor há duas fases de contatos:
o PIDGIN e a fase do crioulo. A primeira é considerada uma língua de emergência
rudimentar e não natural e a segunda uma adaptação mais complexa e rica do PIDGIN,
ou seja, a adaptação de uma língua por falantes de outras línguas. Desta forma alguns
autores justificam características do português brasileiro como resultado de
uma língua crioula, adaptada do português por índios e africanos. Já a
internalista considera o português brasileiro uma continuação do português
europeu, refletindo hoje o que foi em Portugal o português.
Sobre as origens do português brasileiro: No período da
colonização do Brasil, a base da população brasileira era composta por índios, escravos
e portugueses. Com o passar dos anos, imigrantes estrangeiros como italianos, espanhóis,
franceses, japoneses e entre outros começaram a fazer parte da população
brasileira. Houve a expansão de costumes, culturas e conseqüentemente línguas foram
extintas se fundiram.
Influência indígena: As tribos indígenas foram o primeiro contato dos
portugueses ao chegarem ao Brasil. Ao lado da vasta população indígena havia a dinâmica
das línguas. Embora seja possível ter certeza quanto ao número de línguas existentes,
havia cerca de 1500 línguas indígenas no período da colonização. A tupi foi a
que mais conviveu com o português durante o processo de colonização e deixou heranças
na língua. Esta contribuição se manifesta de forma significativa no campo
lexical, especificamente nas denominações relativas às cidades, Estados, flora
e fauna. Melo (1981) cita exemplos como Andaraí, Brocoió, Cabuçu, caju,
carioca, Gambôa, Guanabara, Jacarepaguá, Ipanema, Irajá, Pavúna, Tijuca e
outros. Castilho (2010) afirma que o grosso das contribuições lexicais para o
português brasileiro, oriundo do tupi-guarani, cedeu mais de 10.000 vocábulos
constantes, na maioria topônimos e antropônimos. O autor salienta que não há
comprovação da influência indígena na fonologia ou gramática.
A influência africana: A influência mais profunda das línguas
africanas no português brasileiros está na morfologia. Conforme o autor, a
simplificação e a redução das flexões comuns na fala popular brasileira é herança
das línguas dos escravos. Como o exemplo “os homi”, “as prima já chegaro”. Outro
fenômeno é a deglutição e aglutinação de fonemas como acontece com o “s” do
determinante, que se incorpora à vogal da palavra seguinte, produzido uma nova
forma autônoma e fecundante, como no exemplo “zarreio” (resultado de os
arreios), “zome” (resultado de os homens).
Já outros fenômenos são tratados como
dupla influência: africana e indígena. Spina (1987) traz como exemplo a
influência desses dois povos o caso da vocalização do digrama lh em “i”, como muié, mio, fio, espeio, oio, mió
(mulher, milho, filho, espelho, olho, melhor); supressão da dental d do grupo consonantal nd, nas formas and, end, ind: falano, dizeno, vestino (falando, dizendo e
vestindo); redução dos ditongos ou e ei em porquera, manera, falô, otrora, estora (porqueira, maneira, falou,
outrora e estoura).
A língua do Brasil e o dialeto caipira: Entre os dialetos que caracterizam as
diferenças do português brasileiro, destaca-se o “dialeto caipira”. Como a colonização
do Brasil se deu inicialmente em território rural, pelo fato pelo de antes das cidades
existirem fazendas, sítios e engenhos, a mistura da língua portuguesa trazida
de Portugal, composta por outras línguas da região, compôs o dialeto caipira. Conforme
esclarece Ribeiro (1995): entre colonos portugueses, índios e negros, a eles se
juntaram o caipira emergente na região Sudeste, primordialmente no Estado de
São Paulo. Ele se expande para o Centro Oeste através das Bandeiras. Após a derrocada
da mineração no final do século 18, as populações que se concentravam nas
regiões de Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso se dispersam e retomam o modo de
vida rústico da antiga população paulista, determinando a cultura caipira.
Amaral (1920), afirma que o intitulado dialeto caipira se destaca por questões relacionadas
à fonética, morfologia, sintaxe e vocabulário, além da concordância verbal e nominal.
O autor afirma que existe a característica do R retroflexo, ausência de
consoantes laterais palatais LH, permutados pela semivogal l. A queda do R
final de verbos infinitivos terminados em ar
e er, além de fenômenos que o distingue
das demais variantes.
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