A igreja estava tomada de pessoas e ninguém parecia entender o que estava acontecendo. Seria possível estar ali, dizendo adeus o Padre Cláudio? Não seria um sonho, do qual todos acordariam assustados? Um pesadelo talvez? Infelizmente não. Era mesmo o momento de dizer adeus. De conter as lágrimas insistentes a cada hino triste. De ouvi-lo pedir atenção. De fechar os olhos e vê-lo a sorrir.
O calor do ambiente lotado não fazia ninguém desistir de ficar ali, absorvendo cada palavra, emocionando-se a cada homenagem, sentindo cada vez mais a proximidade da partida. Adultos, crianças, jovens e todos, sem distinção, sentiam-se órfãos. Sem o amigo, o protetor, o quase parente Cláudio Romano. O ibiporãense que, às vésperas de partir, resolveu ficar para sempre.
Após as exéquias, das quais participaram 50 religiosos, entre padres e bispos, o corpo do amado irmão saiu do templo onde, no dia anterior, rezara sua última missa. Um cordão de isolamento formou-se com alunos da Escola Santa Marta e da Apae. Aplausos intermináveis marcaram a saída do cortejo. Muitos decidiram seguir a pé até o cemitério. Na frente do carro fúnebre, coberto por dezenas de coroas, seguiam dois carros da polícia, para garantir a passagem do funeral. A tarde estava indo embora. Era um dia estranho sem sol. Uma tarde viscosa quase sem vida, enevoada e esquisita. Triste.
Em meio à procissão fúnebre, a equipe religiosa com belos trajes toca uma música solenemente melancólica. As pessoas cantam junto e depois rezam. Por onde passa o séqüito, fiéis aglomerados esperam o amigo. Árvores com aspecto ressequido jogam suas últimas folhas ao chão. De algumas, leves flores amarelas se deixam levar suavemente. Nenhuma folha se move nas árvores. Nenhuma brisa sopra. O céu está brusco e já demonstra sinais noturnos. As luzes sinalizadoras em cima dos carros batedores e do carro fúnebre dão um colorido estranho às pessoas que se encontram mais próximas a eles.
Olhando para trás, uma procissão sem fim de carros com suas luzes acesas. Incansável, a multidão reza e entoa canções tristonhas. Em cada portão, um olhar triste. Em cada janela um vulto a espiar discretamente. A noite está tomando conta do dia. Há luzes nas casas e um discreto aroma de jantar no ar.
Envolvidas em um início de noite, as pessoas são recepcionadas no cemitério por uma enorme lua cheia, de cor alaranjada, que nos observa por detrás de grossas e escuras nuvens. O local está sem iluminação, totalmente tomado por pessoas afoitas por ver o amigo uma última vez. Uma música tocada pelo Coral Sertanejo o recebe em sua chegada. As luzes instaladas para iluminar seu túmulo dão um aspecto sombrio ao rosto das pessoas próximas. Feições desamparadas. Rostos pálidos. Pessoas cabisbaixas e chorosas. Olhares perdidos vagando em busca de conforto.
Os músicos chegam. O flautista toca solitário. Enquanto é colocado em sua sepultura, o amigo é novamente aplaudido calorosamente. Uma a uma, as pessoas vão saindo. Um vento gelado começou a soprar entre os presentes. Os músicos abandonam seus instrumentos e entoam uma melancólica Ave Maria num coro gregoriano afinadíssimo.
Poucas pessoas restaram e agora os pedreiros preparam em silêncio a nova morada. Milhares de flores sobre o túmulo. Silêncio e frio. Um pai chega com sua filha tímida que, ajudada por ele, deposita uma singela flor dentre as centenas ali deitadas. Ficam por ali um tempo e se vão também.
Dia triste. Noite fria. Lua cheia. Flores aos montes. Saudades no ar. Lembranças de alguém que ainda parece estar entre nós. Cláudio Romano. Só. Com as flores. Com a noite. Com Deus.
Marilza Ribeiro Longhi - Pastoral da Comunicação de Ibiporã
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