sábado, 15 de agosto de 2009

Quando Hearst morreu, em 1951, aos 88 anos, já era quase uma lenda. Poucos jornalistas ou donos de jornal ficaram tão famosos na história da imprensa. Sua vida foi objeto de mais de uma dúzia de biografias, a primeira das quais data de 1928. Ele não teve interesse em lê-la. "Se não contar a verdade vou ficar furioso e se contar a verdade vou ficar furioso." Mas a figura de Hearst no imaginário popular deve-se em grande parte a obras de ficção divulgadas quando ainda vivia. Aldous Huxley, no romance "After Many a Summer Dies the Swan", retrata um velho milionário americano, dono de um castelo na Califórnia, rodeado de objetos de arte que não consegue apreciar e que, com medo de morrer, monta um laboratório cujos técnicos tentam prolongar a vida do patrão. Foi uma caricatura dos seus piores defeitos.

Para milhões de pessoas a imagem de William Randolph Hearst ainda se confunde com a de Charles Foster Kane, o personagem de "Cidadão Kane", que é, para muitos cinéfilos, o melhor filme da história do cinema, interpretado e dirigido por Orson Welles. Aparentemente, há semelhanças demais entre o roteiro de "Cidadão Kane" e o livro "Imperial Hearst", de Ferdinand Lundberg, para ser coincidência. Kane é um rico herdeiro, dono de jornais e colecionador de arte, de grande talento e ambição, que fracassa em suas tentativas na política e, depois de perder a mulher, casa com uma cantora lírica de pouco talento, Susan Alexander, e tenta transformá-la numa estrela. Ela, desesperada, se refugia na bebida. Ele termina seus dias na solidão do enorme castelo que construiu, Xanadu. A figura de Kane, na magistral interpretação de Welles, lembra imediatamente a de Hearst e inspira mais simpatia e, no fim, mais compaixão, do que repulsa. Mas a cantora lírica do filme nada tem a ver com Marion Davies, a estrela de cinema amante de Hearst na vida real, de reconhecido talento; as afetuosas relações entre os dois foram o oposto das mostradas no filme. Se foi a intenção de Orson Welles dizer que Kane não era Hearst porque Susan não era Marion, poucos acreditaram.

Para várias gerações, o nome de Hearst foi sinônimo de jornalismo escandaloso, oportunista e sem escrúpulos, que baixou os padrões éticos da imprensa, distorcendo os fatos e inventando, mais interessado em deformar do que em informar, com o único objetivo de ganhar dinheiro. Poucos jornalistas ou donos de jornal ficaram tão famosos na história da imprensa. Esta percepção está sendo mudada. Hearst ainda exerce um irresistível fascínio sobre os escritores.

A biografia mais famosa, "Citizen Hearst", de W.A. Swanberg, publicada em 1961, vencedora do prêmio Pulitzer, é sumamente crítica, embora deixe entrever uma mal escondida simpatia, sobretudo pelo personagem dos primeiros anos. Recentemente, houve um esforço revisionista que vê a obra de Hearst com outros olhos. Destaca seu extraordinário talento jornalístico, sua generosidade e genuína simpatia pelos mais fracos e coloca em perspectiva a imprensa da época. Uma obra de algum valor é "William Randolph Hearst: The Early Years 1863-1910", de Ben Procter, de 1998. Muito mais importante é "The Chief: The Life of William Randolph Hearst", de David Nassaw, de 2000. O título é uma referência ao apelido de Hearst dentro de sua organização. Os recados que seu secretário mandava diariamente aos executivos começavam assim: "The Chief says:" (O Chefe diz:). A obra mais recente, e que me levou a escrever estas linhas, é "The Uncrowned King: The Sensacional Rise of William Randolph Hearst", de Kenneth Whyte, publicada neste ano.

Whyte preparou um alentado volume de 546 páginas para narrar em detalhes minuciosos a entrada e consolidação de Hearst no mercado de Nova York e principalmente sua competição com Pulitzer. A epopeia começa em 1895, com a compra do "New York Morning Journal", e termina em 1898, depois da campanha de Cuba, com seu predomínio sobre a concorrência. Mostra um Hearst sob uma luz muito favorável. O autor pesquisou exaustivamente e escreve que, com frequência, o sensacionalismo atribuído com exclusividade a Hearst era comum a todos os jornais; afirma que ele não provocou a guerra contra a Espanha, embora reconheça com relutância que ele ajudou a criar um ambiente que levou à declaração de guerra. Afirma também que o célebre telegrama "Providencie os desenhos, eu providenciarei a guerra" nunca foi transmitido, e mostra uma excessiva preocupação em contradizer o livro de Swanberg até em questões de pouca relevância.

A principal base para a lenda negra em torno de Hearst, segundo Whyte, foi um famoso perfil escrito por Lincoln Steffens, que o entrevistou cinco vezes para "The American Magazine", em 1906. Pelo resumo de Whyte, Steffens descreve Hearst como um homem inteligente e ocasionalmente com boas intenções, mas perigosamente rude e agressivo, com poder e dinheiro, mas sem amigos, lar ou escrúpulos, manipulado por seus empregados, vivendo nas sombras e psicologicamente doente, obsessionado com histórias de assassinatos e vícios. Realmente, embora o resumo que Whyte faz do artigo seja demasiado caricaturesco - Steffens foi mais equilibrado em seu perfil do que Whyte admite - e omita que Hearst reconheceu exageros de sensacionalismo em seus jornais, a conclusão final do artigo foi que, a julgar pela maneira de dirigir seus jornais, Hearst seria um homem perigoso se eleito para um cargo público.

Em sua autobiografia, porém, Steffens diz que foi pressionado pelos editores da revista para pintar com tintas mais negras um homem que eles odiavam. Concordavam com sua política, mas detestavam seu estilo. Ele concordou, "para manter meu emprego". Segundo Steffens, Hearst "era um grande homem, capaz", sem ilusões morais, e preocupado com uma sociedade mais democrática.

A tentativa de mudar a imagem de Hearst e de acabar com alguns mitos em torno dele parece oportuna, mas talvez tenha ido demasiado longe. E, apesar desse revisionismo, a imagem de William Randolph Hearst parece indissoluvelmente ligada à de Charles Foster Kane. A ficção predomina sobre a realidade.

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