domingo, 14 de junho de 2015

O que é Reforma Universitária?

          Muito e pouco, tem-se falado sobre reforma universitária. Com certeza, em algum momento, você já ouviu sobre ela e provavelmente não sabe o que significa. A palavra reforma nos traz a idéia de melhoria e quando se trata de ensino, tendemos sempre a concordar que ela é necessária.Basta olharmos a própria UEL onde, passados mais de seis meses, ainda há falta de professores. A escassez de docentes é um dos inúmeros problemas enfrentados pelo ensino superior no Brasil. A insuficiência de recursos atrasa e sucateia as universidades públicas e quem sofre com isso é a sociedade, afinal, o conhecimento produzido no campo acadêmico, em tese, deveria ser voltado para o bem social. Assim, fica evidente que é necessário uma mudança, mas aí surge uma dúvida: por que alguns são contra e outros a favor da tal reforma?

          Em primeiro lugar é preciso entender o que é a reforma, para se poder tomar uma posição em relação a ela. O que se tem de concreto da proposta do governo federal é um documento elaborado pelo Grupo de Trabalho Interministerial, que sugere medidas para o enfrentamento da crise do ensino superior brasileiro.E, são algumas dessas sugestões que têm causado polêmica e repúdio por grupos da sociedade.
          
     O grande ponto de discussão é a questão da autonomia financeira das universidades.Tal documento sugere uma maior liberdade na captação de recursos por parte das instituições,o que quer dizer que elas ficam livres para parcerias com o setor privado.Porém, críticos afirmam que isso é uma forma do governo se isentar da responsabilidade de financiar a educação, que é um direito garantido pela Constituição. Também se discute a possível subordinação do conhecimento ao mercado, uma vez que seriam seus membros que o estariam financiando. Analisando o contexto atual de nossa sociedade, não é muito difícil imaginar os rumos que a educação tomará. Tomemos por base outros setores que embarcam nas exigências impostas pelo mercado, adaptando seus objetivos e ideais ao mundo globalizado. A cultura de massas e a imprensa são exemplos atuantes dessa subordinação.

          Esse é só o primeiro ponto criticado, outras propostas também foram duramente combatidas, principalmente no que se refere à insuficiência de vagas e na forma como o governo federal quer solucionar o problema.Sabemos que o aumento das verbas destinadas às universidades proporcionaria o aumento da oferta de vagas, porém o governo afirma que isso no momento é inviável, pois o compromisso em atingir o superávit primário compromete amargamente o orçamento público. Entretanto, como solução, é apontado o ensino a distância, que aumentaria em 500 mil o número de alunos nas instituições públicas, atingindo as metas determinadas pelo Plano Nacional de Educação.Porém, reduzir o ensino a um curso do tipo “faça você mesmo” é inadmissível, ainda mais quando associado ao programa “Universidade Para Todos”, o PROUNI, que prevê a isenção de impostos as instituições particulares em troca de bolsas de estudos a estudantes carentes. Isso pode ser considerado um desvio de verbas públicas, já que o dinheiro desses impostos poderia ser revertido para o ensino público, que nesse caso é notoriamente melhor que o privado O PROUNI foi aprovado através de uma medida provisória. Segundo o ministro Társio Genro o projeto era de urgência, pois, 87 mil alunos terão o beneficio das bolsas ainda no próximo ano. Os donos das universidades particulares agradecem, afinal, sairão de crise de inadimplência que ameaça o setor privado.

          A atitude de imposição do PROUNI, que ainda estava sendo discutido, contraria a disposição afirmada pelo Estado em discutir abertamente com a sociedade. É esse o ponto que cria divergências no movimento estudantil. A UNE é a favor da reforma, alegando que o ensino superior tem que ser melhorado, entretanto, não concorda com todos os itens inseridos no projeto oficial ,mas sugere modificações e apresenta o seu modelo de reforma, acreditando na eficiência do diálogo com o governo. Já outras organizações afirmam que essa negociação é impossível, que interesses do governo e dos estudantes são antagônicos e como a mudanças no projeto não ocorrerão, a solução é a total negação e luta contra a reforma.

         Respeitando-se ambas as posições, algo é certo:essa reforma precisa ser discutida de uma forma mais ampla. A alienação no meio acadêmico é geral, e a omissão decorrente dela é preocupante.O ensino superior brasileiro mostra-se deficiente e pode se tornar ainda mais debilitado se subordinado a interesses de mercado. E, é contra isso que devemos lutar, em busca de um ensino de qualidade e gratuito. Se conquistaremos isso estando ao lado ou contra o governo é uma escolha que devemos fazer depois do esclarecimento e debate dentro da própria universidade.É necessário levar essa discussão para as salas de aula e cobrá-la dos órgãos que nos representam como os C.As e DCE. A mudança que queremos somente será conquistada através de nossa mobilização e não com a indiferença e apatia com a qual estamos acostumados a assistir os mandos e desmandos do Estado.


Posição da UEL: A princípio a Universidade é a favor da Reforma. Isto ficou claro na entrevista concedida ao DCE pela reitora Lígia Puppato.

DCE: O governo ao propor a Reforma Universitária, se dispôs a discuti-la com a sociedade, tanto acadêmica quanto a civil.Porém, isso na prática não está acontecendo. Tanto é, que houve imposições como o Programa Universidade Para Todos, o PROUNI, aprovado na forma de medida provisória. Mas o debate foi proposto. Aqui na UEL, o que foi feito ou será feito para levar essa discussão aos estudantes?

Lígia: Eu acho que essa é a discussão mais importante que nós temos hoje no país. Nós vamos ter agora um debate que a Universidade está promovendo sobre Reforma Universitária. Vamos trazer pessoas do MEC, estamos chamando pessoas do movimento dos docentes, enfim, as visões em diferentes parâmetros sobre isso. Eu acho de extrema importância que toda a comunidade faça essa discussão.Acho que o governo federal já fez algumas discussões, eu ,inclusive, já participei de um encontro da Associação Nacional dos Reitores das Universidades Estaduais e Municipais no Rio de Janeiro. Participei também de uma discussão com o Ministro da Educação aqui na Universidade Federal do Paraná ,há alguns meses atrás. É lógico que quando você vai fazer uma reforma é uma coisa polêmica, você vai ter visões diferentes e não vai contemplar todo mundo.

DCE: Com os debates a respeito da Reforma, têm-se questionado a função da universidade, que seria produzir conhecimento voltado para o bem social ou conhecimento como um bem de consumo?Alguns críticos dizem que essa Reforma é mais um meio de se adequar o ensino à lógica do mercado. Já outros dizem que é uma possibilidade de ampliação da educação. Na visão da UEL, a Reforma atende qual objetivo?

Lígia: Eu acho que está ampliando.Para mim, o ponto significativo ,que vai ter peso com a Reforma, é inserserssão da universidade na sua comunidade.Eu acho que a universidade tem que ser uma mescla de várias coisas, por exemplo, ela tem que ser o local , onde se faz pesquisa básica, e também tem que continuar existindo a pesquisa de inovação tecnológica. E a hora que você discute a inovação tecnológica, logo, você tem que tomar cuidado com isso,mas você também tem que estar associado ao mercado. A universidade tem que estar preocupada em atender a demanda por tecnologia que no país é usada pelo mercado, mas não é só isso; ela também tem que ter como diretriz a sua contribuição na melhoria das condições sociais do país. Eu acho que essas três coisas fazem parte da nossa missão, elas estão presentes e nós temos que ter isso como foco de uma instituição completa, que faz ensino, pesquisa e extensão

DCE: Mas com as PPPs, parcerias público privadas, que estão sendo contempladas na Reforma Universitária, a pesquisa básica e a pesquisa de extensão, voltada para a comunidade, não seriam deixadas a um nível abaixo,para ser contemplado mais a pesquisa voltada para o mercado?

Lígia: Eu acho que não. No meu ponto de vista, as PPPs não tem nada haver com essa Reforma Universitária,

DCE: Mas o documento aponta outras formas de financiamento

Lígia: O que deixa claro, no documento que eu tenho acesso, é que o Estado tem que financiar a Universidade. Outra questão,é quando você fala dos financiamentos das agências financiadoras de pesquisa . Eu acho que há uma outra concepção , que hoje é muito bem contemplada nesses três eixos, ensino, pesquisa e extensão.Eu acho que os financiamentos têm que dar conta desses três eixos,desse foco ,porque nós estamos pensando no desenvolvimento do país.E esses três se complementam e têm que estar presentes.

DCE: Essa reforma está sendo fatiada no Congresso e uma das medidas adotadas foi o PROUNI, que vai comprar vagas nas universidades privadas.Não estaria acontecendo assim, um desvio do dinheiro, que poderia ser investido nas universidades públicas, para comprar vagas nas particulares?

Lígia: Eu acho que tem a questão do ideal e do possível. Porque, hoje o Brasil, mesmo dentro da América Latina , é o país com o menor percentual de jovens na universidade. São 9%, dos quais 70% estão nas instituições privadas e 30% nas públicas. As universidades públicas, de uma maneira geral, ficaram abandonadas nesses últimos anos. Há uma demanda enorme de jovens que querem e têm o direito de entrar na universidade.Então dos debates que eu participei, eu acho também, que o foco do governo tem que ser aumentar as vagas nas universidades públicas, só que isso não vai ser feito agora, isso é um projeto a médio e longo prazo.Você num primeiro momento desafoga essa demanda que é imensa, mas ao mesmo tempo não pode descuidar da preparação, de estar jogando dinheiro nas instituições públicas, para que a médio e longo prazo, essas vagas sejam ofertadas,como é uma das diretrizes da Reforma . Eu acho que são questões paralelas, veja bem , se você esperar mais quatro anos , são quatros gerações que estão aí , sem qualquer possibilidade de ensino público.

DCE: Um dos projetos para aumentar as vagas nas universidades públicas seria o sistema de ensino a distância. Isso não prejudicaria a qualidade do ensino?

Lígia: Eu acho que sim. Mas, infelizmente, isso é uma coisa que não tem volta. Eu participei de um congresso mundial em Cuba, no começo do ano, que discutia o ensino superior no mundo, logicamente, voltado para a América Latina. E a avaliação de todo mundo que estava lá, os mais diferentes países, é que para superar essa demanda pelo ensino superior, que existe nos países latinos como um todo,não há possibilidade de você corrigir isso em curto prazo, a não ser pelo ensino a distância.

DCE: Mas vale a pena?

Lígia: Pois é, há um ano e meio atrás nós aqui da UEL achamos que não valia a pena ,mas você tem que começar também a refletir e estudar sobre isso. A gente tem que ter informação, quanto mais eu participo de discussões, tanto nacionais quanto internacionais, todas as argumentações que eu ouço são nesse sentido.Eu acho que é uma preocupação que nós temos que ter, uma reflexão, eu digo que é um mecanismo que não tem volta baseado nas discussões que estou fazendo. Hoje, a maior parte das universidades públicas do Brasil já têm ensino a distância. Aqui no Paraná, a Universidade Federal do Paraná e as Universidades de Ponta Grossa e Maringá já têm o ensino a distância. Nós estamos como uma ilha e acho que daqui a pouco, vai haver uma cobrança da sociedade como um todo, para que isso aconteça. É uma situação que nós temos que refletir sem perder o foco da situação ideal.

DCE: De uma forma geral a UEL aprova a proposta da Reforma Universitária?

Lígia: Sim, dentro dos parâmetros que eu te falei, e que eu acho que são os pilares que norteiam a Reforma, pilares que a gente sempre brigou, como o bem público,a autonomia didática e financeira, a inclusão social, a mudança no sistema de avaliação e permanência. Agora obviamente, são pilares que nós precisamos saber no detalhamento como isso vai ficar.

DCE: Mesmo correndo o risco de acontecer como na Reforma da Previdência , na qual existia o ideal e o possível.Mas depois, o que foi aprovado não foi nem o ideal nem o possível ?

Lígia: Mas nós não vamos querer isso .Isso que estou te falando está escrito. Autonomia e financiamento , avaliação, estrutura de gestão, isso está num documento e esses são pilares de documentos redigidos e a gente vai brigar por isso. Se for isso que está escrito, a gente consegue avançar, se não for que pena, porque eu acho que nós estamos em um momento de repensar toda a universidade. Mas qual é a situação ideal? Hoje, é uma reflexão.O profissional que nós formamos hoje, tem que ter uma visão global daquilo e não uma visão direcionada, como era antigamente. Todos nós, em qualquer mudança que sejamos submetidos ,é natural que existam resistências , só que o novo também tem que ser refletido.Tem que haver muita discussão sobre isso, por isso ,eu digo ,não sou totalmente a favor ou totalmente contra, nós temos que mudar, isso para mim é muito claro, e como nos vamos fazer isso...?

DCE: E a posição que os alunos escolherem, a UEL vai levar em consideração ou não?

Lígia: A minha proposta é que a universidade como um todo discuta isso, os alunos junto com os docentes, porque a universidade somos nós que fazemos. Essa troca de idéia e reflexão tem que existir de todo mundo. Todos nós estamos envolvidos no processo. Por isso,vamos fazer os debates e uma ampla divulgação, para que o maior número de pessoas participem. e discutam, para que a gente possa contribuir com o debate nacional. Para que as coisas aconteçam se possível da melhor maneira possível e do jeito que a gente acredita.

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