quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Os artistas populares


Suas cadeiras, mesas e artefatos de madeira são reconhecidos pela durabilidade e qualidade. Tamanha a fama que ganhou o apelido de um móvel: Zé Cadera. Zé Cadera, ou José Carlos Paris, 50, tem público fiel as quintas e domingos na Pizzaria Estação do Alto, localizada na Avenida Lúcia Helena Gonçalves Viana, 1100, Jardim Pacaembu.
“Ganhei o apelido porque sou marceneiro”, diz Zé Cadera que começou a vida artística há vinte anos. Sempre cantou e tocou teclado. “Aos treze anos meu pai me deu um acordeom e animávamos bailes na roça. Casei-me com Rosângela Bruno Andrade e há cinco anos voltei com as apresentações. Ela não é ciumenta, dá apoio e ajuda a classificar as músicas”, diz.
Paris mora da Vila Casoni. Além de estabelecimentos comerciais é solicitado para casamentos e aniversários, onde canta e toca músicas formais. O mais curioso é que ele ensaia quando está no ofício de marceneiro. “Ao fazer um móvel, serrar um pedaço de madeira ou martelar um prego, canto inspirado em Chitãozinho e Xororó devido o tom alto da voz”, diz. No repertório músicas românticas e sertanejas populares como “Só liguei para dizer que te amo”, de Alan e Aladin.
“Ele melhorou o movimento”, diz Nadir Fragoso Gomes, 54, administradora da pizzaria. Moradora do Pacaembu há treze anos, ela conta que é comum clientes pedirem músicas a Paris, subirem no palco ou entoarem em coro as canções. “Toco teclado e o cliente canta”, diz Zé Cadera.


A Esquinão foi comprada recentemente por Edna Gaioski, 43, do Violin. “Todas as terças e quintas tem música ao vivo. Na quinta é a vez do César Matos”, diz a proprietária. César, 36, mora no Pacaembu e afirma que toca por hobbie. “Sou formado em Processamentos de Dados e vivi de música dos 14 aos 23 anos. Com shows consegui pagar o curso, em Assis, São Paulo. Tocávamos muito vanerão e música gaúcha devido o sucesso do Gaúcho da Fronteira na época”. Radicado em Londrina há 14 anos montou uma empresa de informática e hoje trabalha no setor administrativo de uma grande empresa. Casado há sete anos com Simone Matos, 26, César concilia o trabalho formal com o artístico. “No emprego é comum os colegas perguntarem quando haverá apresentações. A principio, a Simone não gostava. Ela viu que era minha vontade e aprovou”, diz o artista popular. César cobra o cachê de R$25 para tocar de duas a três horas, músicas variadas que vão do sertanejo ao rock nacional dos anos 80.
“Existem muitos lugares para se divertir na Zona Norte de Londrina”, diz Edson da Silva, 29, residente no Jardim Paraíso e garçom do Esquinão, que fica na Avenida Lucia Helena Gonçalves Viana, 1025. Conhecido por todos que freqüentam o estabelecimento, Edson exerce a profissão de pintor durante o dia. O “bico” de garçom gera uma renda extra e Edson acha um absurdo o projeto da Lei Seca que estabelece funcionamento de bares até as 23 horas. “São poucos os locais para diversão. Imagine se fecharem mais cedo?”

Ela jovem e parece uma menina. Durante o dia, quem a vê na produção e venda de bijuterias e perfumes não imagina que em sua simplicidade se esconde uma grande cantora com um próspero futuro. Seu nome é Vandressa Amorim. Nas noites, a bela morena de vinte anos, que mora no Jardim Paraíso, arrebata corações apaixonados e faz desde o jovem ao mais velho dançar ao som de suas canções.
Todas as apresentações são acompanhadas pelo “pai coruja” e contador Valdemar Amorim, 57. Ele diz não ser enciumado. “Vou junto porque ela é muito bonita. Depois da apresentação, alguém pode roubá-la de mim”, diz alegremente Valdemar.
Vandressa começou a cantar por volta dos quinze anos, por influencias de familiares que tinham a banda “Os Monumentais”. “Era uma banda formada por irmãos entre 1967 a 1974”, diz o tio Antonio Odilon Amorim, 58, que ainda toca acordeom e tem filhos que seguiram pelo caminho da música. “Isso é tradição familiar”, completa. “Pedia ao meu tio para tocar musicas no acordeom. Depois as cantava. A música ‘Boca a boca’ foi uma das primeiras”, diz à cantora que tem o forró no repertório e que imitava a dançarina de axé Carla Perez.
Vandressa Amorim se apresenta todos os dias da semana. Nas quartas o show é na Toca do Tatu, no Heimtal e na quinta é a vez da Lanchonete e Petiscaria Point dos Amigos, que fica na rua Chupim. Além de Londrina, ela tem agenda em cidades da região e recentemente, no reveillon, estava em Varginha, Minas Gerais, onde fez muito sucesso.

domingo, 13 de janeiro de 2008

A construção da alegria

Passa a bola não demora.
Ergue a cabeça vê o lateral
e corre em direção à meta.
Passa um, dois, três.
Na arquibancada a torcida se emociona,
o sorveteiro arregala os olhos,
o senhor uniformizado levanta-se,
o locutor se contagia,
o garoto se esquece que é Domingo.
Será um gol?
Drilha um, dois, três.
Olha para direita, ninguém livre.
Para a esquerda o lateral está marcado.
Na torcida o fanático grita.
No gramado o juiz corre.
O locutor se empolga,
o gândula sonha em ser o matador e
o treinador sabe que o lance pode definir o jogo.
Ele corre com a camisa suada,
olha para o gol - pode ser agora!
Prepara o pé direito, escolhe o canto esquerdo.
Não pode decepcionar sua torcida.
Se fizer será a glória.
Se errar a derrota.
Chuta rápido.
O grito sai engasgado.
O atacante está marcado,
não dá mais.
Pé firme chute forte,
bola no ângulo.
É o gol da torcida.
Alegria do povo!

quinta-feira, 10 de janeiro de 2008

BÊ-A-BÁ: Juntando as letras elas descobrem o mundo

Alfabetizando Londrina muda a vida de pessoas que nem conseguiam ler o itinerário dos ônibus.
Se você lê esta reportagem, provavelmente não imagina o quanto deve ser difícil não saber juntar as letras e dar sentido à frase. Seria como chegar a um ponto de ônibus no Afeganistão ou na China se deparar com placas que nada significam. Era assim a vida de Francisca da Silva Milani, do Semíramis Braga, até pouco tempo atrás.
Dona Francisca chegou a pegar ônibus errado porque não sabia ler. Até decorou os números, mas nem sempre dava certo. Conta que uma vez ficou tão nervosa por ter se enganado que até chorou no ponto. Para tomar remédios, pedia ajuda do marido que lia a bula e a informava o horário certo de tomar a medicação.
Mas nem foram essas as dificuldades que a motivaram a se alfabetizar. Muito religiosa, queria ler a Bíblia e "passar a palavra de Deus adiante." E deu os primeiros passos. Matriculou-se numa turma do programa Alfabetizando Londrina (Allo), no Centro Social Marista.
Na mesma classe, a diarista Vera Helena Pereira Cruz, do José Belinati. Ela não teve oportunidade de estudar quando mais jovem porque a escola ficava muito longe de casa e precisava trabalhar. Hoje, mãe de três filhos, acredita que o estudo é essencial na vida das crianças e se esforça para ler e escrever. Assim conseguirá uma chance melhor no mercado de trabalho.
Bem-humorada, lembra-se de quando alguém pedia para anotar um recado e não sabia escrever, "guardava tudo na cabeça". Agora nem precisa mais exigir tanto da memória.
Doze filhos, 35 netos e nove bisnetos. Família constituída, dona Ana Pimenta, do Violin, encontrou um tempo para realizar o sonho adiado durante quase toda vida: estudar. Na adolescência, foi impedida de ir à escola pelos pais que eram muito conservadores.
Marilda de Souza Emereciano, até teve a oportunidade de se alfabetizar quando criança, mas largou os estudos com medo da professora. "Eu apanhava de vara de marmelo se não respondesse direito", diz, acompanhada da irmã Maria do Carmo.

domingo, 6 de janeiro de 2008

Literatura Marginal - 157 Assalto a mão armada - Parte I

Quando a vi pela primeira vez não imaginei que ficaria tão apaixonado. Lúcia, 16 anos, uma linda morena dos olhos e cabelos negros. Suas madeixas eram longas e quando batia o vento movimentavam-se como as ondas do mar. Apesar dos nossos bairros serem vizinhos, nunca trocamos uma palavra. Ela vivia rodeada de amigos que me olhavam com ódio devido uma antiga rivalidade. Morava no Bairro da Linha e Lúcia na Vila dos Santos. Todo dia a cena se repetia. A bela morena passava com suas longas madeixas na rua de casa quando voltava da escola. Lá estava eu com os amigos do Bairro da Linha. Jamais conversamos, mas havia a troca insinuante de olhares. Certo vez, quando estava com suas amigas, cumprimentou-me por educação. Nunca esquecerei esse dia e o guardo na lembrança e no coração. Minha paixão por Lúcia transformou-se em platônica, mas ela nunca me daria atenção devido a rivalidade. Sempre receoso de sofrer um ataque dos inimigos do bairro vizinho, me preocupava em não "vacilar" e sempre evitava determinados lugares. Apesar disso, minha vida era normal. As vezes a ociosidade era eterna e tinha que arrumar uma ocupação. Ficava em casa o dia todo em pensamentos banais ou buscava uma idéia brilhante que rendesse dinheiro. Naquele tempo, era jovem e muito "malandro". Fazia furtos em pequenas lojas, mercados e caixas de ônibus coletivos. Nesse depoimento, relato que ninguém da minha família tinha conhecimento destas atividades ilícitas. Em hipótese alguma fui preso. Não levava isso a sério, era apenas uma distração baseada em romances policiais, literatura marginal e filmes de ação, apesar de precisar de uma grana extra. Quando era início de mês e os assaltos rendiam um pouco mais, chegava em casa feliz, com dinheiro, carnes, verduras e roupas novas. Minha família estranhava, pois não tinha emprego. Dizia que a verba provinha do ofício de carregador de caixas na central de distribuição de hortifrutigranjeiros, onde ganhara as carnes e as verduras. Com o tempo fiz mais furtos, amizades no crime, parceiros de assaltos e conheci alguns traficantes. Por influência deles comecei a fumar maconha. Nunca havia provado a "erva maldita" até assaltar um coletivo e ganhar R$50. Tinha um parceiro no crime com apelido de Maluco que morava numa favela próximo a minha residência. O Maluco dizia que maconha abria o apetite...

Continua......

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

157 - Assalto a mão armada (Parte II)

Acreditei nas palavras do Maluco e dei umas "bolas". Somente com um trago minha visão ficou turva e meus olhos vermelhos. O efeito era uma mistura de fraqueza, alucinações, náuseas e tontura. Á noite, em minha cama, meus sonhos consistiam em viagens alucinógenas onde flutuava e voava. No outro dia a ansiedade era tanta que nem esperei Lúcia passar em frente a minha casa. Arrumei um "camelo", furtei uma farmácia e rumei em direção a casa do Maluco para comprar mais droga. Ele disse que não tinha, mas podia ir na favela buscar o tanto que agüentassemos fumar. Não pensei duas vezes. Joguei vinte reais em sua mão, ele montou na bicicleta e em menos de quinze minutos estava de volta com o fumo. Aquele dia foi especial para mim, pois fumamos maconha o dia todo. Ao chegar à minha residência, meus familiares estranharam os olhos vermelhos e marejados. Perguntaram o porquê do agir estranho. Não respondi e fui para o quarto. Deitei em minha cama e sonhei que dirigia um carro novo importado. Num restaurante pedi whisky escocês, ao estilo caubói, que engoli num trago. O garçom se aproximou com uma bandeja: nela minha cabeça decepada e ensangüentada. Meus olhos eram servidos em espetos de madeira. Ao olhar para o garçom, vi um esqueleto que sorria para mim como um convite a morte. Acordei assustado e suado. Voltei a dormir para esquecer o pesadelo. De manhã peguei a maconha que sobrou, enrolei um "baseado" e comecei a fumar no quintal de casa. Por azar passava uma viatura da polícia na rua. A polícia, desconfiada com o cheiro estranho que vinha de casa parou. Assustei-me com o barulho. Era suspeito de praticar assaltos, imagine agora que era usuário de drogas. Bateram palmas e fui atender. No interrogatório neguei até o fim que praticava alguma atividade ilícita.
- Onde já se viu! Fumar maconha não é coisa de gente direita. Quem faz isso são os desocupados.
Podia ser preso, por isso fiquei com muito medo. Mas acreditam em mim e foram embora. Só foi a viatura virar a esquina que lá estava eu acendendo o "baseado" e dando risadas com o papo para o ar por ter os enganado. Após o episódio dramático saí em busca de mais droga. Cheguei numa rodinha e perguntei pelo Maluco. O Moraes, um carinha que usava um gorro, disse que ele foi preso durante a noite numa tentativa frustrada de assalto a uma loja de móveis.
- Estávamos em dois grupos. O primeiro grupo fugiu por um matagal e o segundo, no qual o Maluco estava, saiu por uma rua deserta. Porém foram abordados pela polícia que efetuou vários disparos. Três deles acertaram as costas do nosso amigo que agora está na UTI. Ele pode morrer a qualquer momento...

Continua....

quinta-feira, 3 de janeiro de 2008

157 - Assalto a mão armada (Parte III)


Quando ouvi essas palavras, quase morri de remorso. Mas quem está envolvido no mundo do crime sabe que esse sentimento jamais pode existir. Independente do que aconteceu, ainda estava com vontade de fumar um "beck". Não sabia o que fazer e a "fissura" era maior. Tomei coragem, arrumei uma bicicleta e fui na "boca de fumo". Na favela perguntei onde era a "biqueira". Disse que era ladrão e que gostava da "ervinha". Os malandros que estavam na rua riram da minha cara e disseram que era um cuzão, um mané e um otário.
- Aqui não vendemos maconha. Só vendemos pasta base de cocaína. O verdadeiro crack, a "nóia". Acho melhor você sair daqui com o rabinho debaixo das pernas, senão levará uns tiros e ficará até sem a cueca. Aqui ladrão não é considerado.
"Ralei o peito" rapidinho. Desolado e na maior fissura, entrei outra vez na favela, mas por outro lugar. As pessoas na rua, na maior parte menores de idade, disseram que sabiam apenas onde havia "nóia". Dei vinte reais e em cinco minutos um garoto trouxe a pasta base de cocaína. Como nunca havia experimentado ele me explicou o procedimento:
- Você dobra uma lata de alumínio no meio e a fura com uma agulha na lateral. Depois é só colocar cinza de cigarro na lata, o crack por cima e queimar com um isqueiro. Não se esqueça de puxar a fumaça pelo buraco que fica na tampa. No primeiro trago tive convulsões e em seguida uma alucinação. Aquela viagem foi demais! Desde então passei a roubar todos os dias para comprar "nóia" na favela. Fumava na lata, no cachimbo ou mesclada com maconha. A loucura era tanta que não me satisfazia apenas com uma pedra. Comecei a fazer assaltos audaciosos e comprar os "PC's", que são pacotes com dezoito pedras de crack. Minha mãe estava desconfiada de algo errado e a cada dia ficava magro e abatido. Se antes gostava de usar roupas de marcas e tênis Nike importado, hoje andava maltrapilho e aos farrapos. Tudo o que tinha havia trocado por droga na "boca". O que fazer? Até a Lúcia, minha paixão secreta, nem me olhava ou dava sorrisos discretos. Creio que ela sentia o cheiro estranho que vinha de casa e notara a palidez em minha face. Minha mãe via minha tumba e meu calvário e tentava em vão ajudar. Eu não dava valor a minha família. Para mim, o que mais valia era a emoção dos assaltos e a adrenalina das drogas...

Continua...

quarta-feira, 2 de janeiro de 2008

157 - Assalto a mão armada (Parte IV)

O crack era minha inspiração. Com ele me levantava e com ele dormia. Conforme os assaltos rendiam dinheiro, ficava mais viciado e comecei a usar cocaína. Num dia inesperado um amigo, que trabalha como office-boy, disse que sua empresa iria despachar um malote com trinta mil reais. Era para ficarmos atentos, pois os seguranças da empresa andavam armados. Tínhamos que conseguir armas em caso de tiroteio. Contatei meu comparsa, o Alexandre, que se prontificou a ajudar na empreita. Ele entraria na empresa com uma pistola Ponto 40. Roubamos uma moto Twister da cor preta, comprei um trezoitão por R$500 e emprestei dois coletes à prova de balas.
Alexandre era o estereótipo de bandido no qual muitos sonhavam em ser um dia: jovem, forte, corajoso e sagaz. Muito respeitado no mundo do crime ostentava no currículo assaltos a mercados, farmácias e postos de combustível. Era amasiado e tinha uma filha de dois anos. Aceitou o convite porque precisava "pinar". Alguns investigadores da polícia estavam atrás dele e quase o levaram em "cana" por ter dado dois tiros no vigia dum mercado. Embora experientes, iríamos entrar em uma nova modalidade do crime: assalto a malotes. Quem sabe um dia não formaríamos uma quadrilha especializada em assalto a bancos?
Quando ia ligar a moto partindo para a ação, pensei, entre diversas coisas em me aposentar. No crime se morre cedo ou logo a penitênciária é o seu destino. Podia ganhar "a boa", montar meu negócio próprio e ser empresário. Seria o gerente da "boca de fumo" onde haveriam diversas drogas. Quem sabe uma sorveteira. Lá os clientes entrariam para tomar cerveja e cheirar cocaína. Se alguém se metesse comigo ou fosse atrás de confusão daria muitos tiros para o ar. Com o respeito adquirido e o dinheiro lucrado com as drogas montaria um prostíbulo num grande sobrado. Comeria todas as putas e ia cheirar cocaína nas costas delas, igual a um filme nacional que assisti de madrugada na TV. Como num fade as imagens mudaram e vi Lúcia, uma adolescente sem maldade passando em frente a minha casa. Evitava-a para não corromper sua inocência pois minha cabeça só servia para arquitetar ações e planos cada vez mais ousados e perigosos.
Liguei a moto e Alexandre confirmou com o boy que o malote estaria embaixo da mesa do gerente, um senhor calvo, gordo, de bigode e óculos com aros pretos. Ela ficava no fim do corredor da sala principal. Não tinha como errar. Quanto ao rateio do assalto, ficaria assim: deveríamos "rachar" com o boy em cinco mil, já que ele deu a "letra" do assalto e não ia "caguetar". Eu e Alexandre ficaríamos com o restante. Nunca atirei em ninguém, apesar de ter praticado assalto a mão armada num posto de combustível. Esse crime, conforme o Código Penal é classificado e qualificado como 157.

Continua...

terça-feira, 1 de janeiro de 2008

157 - Assalto a mão armada (Parte V)

As batias do meu coração estavam tão aceleradas que se confundiam com o motor da moto. Trinta mil é uma boa grana! Antes de sair, rezei um pai-nosso e três ave-marias.
O plano era o seguinte: Alexandre, que estava com a Ponto 40, entraria encapuzado para dar voz de assalto. Eu, que estava na moto, tinha que render o guarda, tomar o “canhão” e amarrá-lo num pilar.
Quando chegamos Alexandre caminhou mais ou menos cinqüenta metros em direção à mesa do gerente. Fiquei lá fora e deixei a moto pronta para sair. Depois segui em direção ao guarda para pedir informações. Parei na sua frente e comecei a conversar. Enquanto isso, na gerência, Alexandre perguntava pelo malote. O guarda percebeu a movimentação e antes que pudesse reagir dei-lhe dei uma rasteira e uma coronhada na sua cabeça. Ele caiu e implorou piedade. Com o vigilante rendido e Alexandre na mesa do gerente, tudo parecia certo. Só que um imprevisto aconteceu: ele não queria dar o malote e Alexandre deu tiro na sua mão. Fomos obrigados a correr por causa do barulho.
- Como você me dá uma dessas? Dar um tiro e sair fora sem nada?
Uma viatura nos perseguiu e tivemos que a atirar. Alexandre foi atingido no pescoço e caiu da moto. Não podia parar, então acelerei. Escondido, soube pela TV que Alexandre morreu com um tiro no pescoço e dois na cabeça. Provavelmente foi executado. Fiquei desolado e sem saber como agir. De madrugada, enquanto dormia, ouvi um ruído. Era tarde demais. A polícia me prendeu e as câmeras de TV me filmaram.
Hoje, dentro de uma cela na cadeia, conto esta história triste e me arrependo de tudo que fiz, desde o momento que comecei a roubar e a usar drogas. Sei que a minha mãe e a mãe de outros amigos que estão nesta cela sofrem pelos erros dos filhos. Se tivesse escutado seus conselhos e andado no caminho certo, provavelmente não estaria amargando essa vida dura. Sonho em sair daqui, constituir família, ter emprego honesto, enfim, um futuro decente. Apagar esse passado triste. Que bom seria se a maldade não tivesse invadido meu coração e eu fosse livre! Poderia sair na rua, ficar em frente de casa esperando a Lúcia passar, admirar seus lindos cabelos negros e até quem sabe lhe perguntar como foi seu dia, se está interessada em tomar um sorvete ou passear no parque, juntos e de mãos dadas.