A música brasileira (em sua vertente erudita
ou popular) é tão rica que suas relações temáticas com a política, artes, comportamento
e a literatura são evidentes e muito amplas. São citações, formas de linguagem,
poemas inteiros musicados e hibridismo da música com a poesia e a prosa.
No
campo da música clássica brasileira, Carlos Gomes transformou o romance “O
Guarani” (José de Alencar) na ópera nacional mais conhecida e encenada no
mundo; Villa Lobos aproveitou o modernismo para usar em bom português os textos
de nossos autores nas suas famosas “Serestas” (para piano e voz) enquanto
Francisco Mignone trabalhou com óperas escritas por autores europeus e
brasileiros. Sua ópera “O contratador de diamantes” utiliza texto do italiano
Gerolamo Bottoni.
Mais
recentemente, Jorge Antunes encontrou no escritor Gerson Valle um grande
parceiro para suas obras musicais como a muito comentada ópera “Olga”. E o
mestre Koellreutter musicou o texto “Café”, do modernista Mário de Andrade com
ênfase na mistura nacionalismo/vanguarda.
A
música popular brasileira é uma verdadeira aula de poesia, revelada em citações
e parcerias entre as duas áreas da cultura. Não faltam, no entanto, espaço para
autores europeus e americanos, principalmente os beatniks.
O cuidado com as letras
sempre esteve presente na história da MPB e do samba como são os casos de Noel
Rosa, Dorival Caymmi, Dolores Duran, Ary Barroso, Humberto Teixeira e Lupicínio
Rodrigues. Com a chegada da Bossa Nova, Vinicius de Moraes impõe novo padrão
estético ao universo das letras vinculando-a também a formas tradicionais e a
elementos modernos como o jazz, o cinema e descrições simples e coloquiais da
vida cotidiana. Vinicius foi fonte e inspiração para tudo o que veio dos anos
50 em diante no Brasil. Sua própria poesia foi fundamental nesse processo, bem
como o apreço de Tom Jobim por Guimarães Rosa, Carlos Drummond de Andrade e
João Cabral de Melo Neto.
O
tropicalismo de Caetano, Gil, Tom Zé e Torquato Neto abriu espaço para Fernando
Pessoa, João Cabral, Cecília Meirelles e Haroldo de Campos nos anos 60. Gil,
com seu texto que revela o metafísico do ser, o zen, o haicai e a alusão ao
aleatório no remete aos poetas japoneses.
Os
anos 70 foram marcados pela linguagem poética colocada como protesto contra a
repressão da ditadura e os poetas-músicos se voltaram para a visão de uma luta
ampliada. É o caso de Belchior, Ivan Lins e Gonzaguinha. Mas houve a adaptação
do Bhavagad Gita (Raul e Paulo Coelho); Zé Ramalho com sua poesia
folk-nordestina-metafísica e Fagner musicando clássicos de Cecília Meirelles e
Fernando Pessoa.
O
rock nacional dos anos 80 trouxe uma geração de livro embaixo do braço como
Renato Russo, Paulo Ricardo, Cazuza e Arnaldo Antunes em abordagem subjetiva e
lírica do amor e da política de Brasília. A ousadia de Antunes trouxe ao mundo
da TV e do rádio os elementos concretistas, signos pós verbais e aleatórios.
Ele é o caso de um artista que vai além de sua época na questão da estética,
como foi Caymmi quando invocou o mar e musicou as imagens narradas em livro por
Jorge Amado: é doce morrer no mar!
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