terça-feira, 30 de dezembro de 2008

"O primeiro brasileiro foi um índio"

O índio Caingang Renato Crine Caiene diz que o conhecimento dos índios do Apucaraninha se baseia numa história presente e dos antepassados. "O que viveu nossos antepassados, é preservado culturalmente. Porém a situação no presente não é igual ao passado como a abundância de caça e de peixes nos rios. As terras foram destruídas e as aldeias do Paraná diminuiram gradativamente. Sabe-se que existe a preservação, mas ela é pouca". Na opinião de Renato, a cultura, o conhecimento e os saberes aos poucos foram retirados pelo não índio. Cabe aos índios dizer e ensinar aos filhos que eles devem se preocupar mais com a preservação do que ainda resta.
"o que conhecemos, passamos aos filhos. No fundo, se existe algum conhecimento esquecido, tentamos resgatá-lo e preservá-lo. Nossa cultura ninguém pode tirar da gente, um direito e cada um possui os seus".
Calene diz que a Reserva do Apucaraninha abriga em torno de 1500 habitantes. São índios que trabalham na agricultura e se preocupam com a saúde e a educação. "Quando estes fatores não estão bons (saúde e educação), procuramos melhorar. Hoje o índio é cidadão e tem direitos iguais, como todo cidadão. Cabe a nós, indígenas, a busca pelos seus direitos e principalmente a liderança. Sou de uma associação e busco os direitos da minha comunidade. Isso resplandece em confiança. Um exemplo é o aumento da população, que torna-se uma preocupação constante. A terra é pequena e daqui alguns anos não haverá espaço suficiente para agricultura e muito menos para a sobrevivência. Por consequência, precisamos de mais terras e da demarcação delas.
Outro ponto é a agricultura, que precisa melhorar. Isso se reflete na alimentação, que deve ser considerada pelo governo estadual, federal e com a ajuda dos depútados. Hoje, no meu conhecimento, o índio é cidadão e ele tem direitos porque elege políticos. É um eleitor que elege prefeito, vereador, deputado estadual, federal, presidente da república e senador. Então, com toda esta responsabilidade, está na hora de aparecer os direitos e a concessão dos mesmos. Tanto no social, como na cultura. O índio é cidadão e ele conhece sua cultura e a cultura não índia. Todos tem direitos iguais.
Caiene, que nasceu no Apucaraninha, tem a mãe como índia da etnia caingang e seu pai, que vem de Ibiama (Santa Catarina), é um índio Xoclén. Para ele, ser Caingang e Xoclén é um privilégio, pois pentence a duas raças distintas. "O índio é da terra e o Brasil é da terra. Como Pedro Álvares Cabral, isso está na história. Quando os portugueses chegaram aqui, foi avistado primeiro os índios. Só que quem descobriu o Brasil foi Pedro Álvares Cabral, que nem índio era. Mas na verdade, quem vivia aqui a milhares de anos eram os índios. Se for para dizer quem foi o primeiro brasileiro, pode-se considerar que foi um índio. Mas isso não é considerado como se têm visto. Infelizmente o índio é visto como um ser que vive no mato. Mas isso não é verdade. Acho que não. Primeiramente ele é um brasileiro, mas sem direitos, garantias e igualdades. Sou índio, mas sou um ser humano. No Brasil o índio sofre muitos preconceitos. Isso deve acabar e deve-se criar uma visão de que ele possui o conhecimento e preserva uma cultura milenar como o gosto pelo trabalho com artesanato ou na agricultura. O preconceito é visto quando o índio que faz artesanato vêm a cidade para negociar seu trabalho. Isso é uma barreira a ser enfrentada. Muitos índios são contra o preconceito. Pela sua natureza, ele vive livre, da mesmo forma como nas aldeias. O preconceito é tamanho, que muitos chamam a polícia, mesmo quando não se está fazendo nada de errado, como roubo. Isso é puro preconceito. Esta situação deve parar. O preconceito também é visto quando defendo meus direitos. Até mesmo na política sofremos preconceito, quando dizem que os índios tem terra, mas não fazem nada. Algumas reservas tem muita terra boa para o plantio de soja e trigo, mas, o que falta para começar a trabalhar? Faltam recursos e principalmente alimentação para fortalecer os trabalhadores. Não tem semente e as vezes se ela existe, não há verbas para se alimentar, trabalhar e comer. Qualqueer serviço que você faça e não tiver recursos para se alimentar, não prospera. Tem gente que não sabe, mas a barriga tamém dói com a fome. Como disse anteriormente, a desmatação acabou com a caça. Tinhamos fartura, pinheiros e pinho, carne assada e peixes. Mas hoje não existe mais. A devastação tomou conta. O que resta nas aldeias está sendo preservado.
O Governo do Estado, junto com o federal e as prefeituras, poderiam fazer um projeto da melhoria da qualidade de vida das aldeias. Um projeto bom para que a comunidade tenha, ou eles mesmos trabalhem, produzam a comida para consumo. Temos essa idéia, porque senão vira aquela história: os índios não trabalham, estão passando fome e vivem na miséria. Ví uma reportagem na televisão que me preocupa. Os índios têm terra, mas não tem condições de cultiva-lá. Acho que está na hora da gente ver isso.

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